terça-feira, 31 de julho de 2012

maratona teatral, Shakespeare e Machado

maratona shakespeareana 
William Shakespeare disputa protagonismo nos palcos brasileiros com Nelson Rodrigues no ano de centenário deste. cerca de 50 montagens do 'bardo' ainda neste 2012. Do "Ricardo 3º" dirigido por Marco Antonio Rodrigues à versão regionalista do grupo Clowns de Shakespeare, sob direção de Gabriel Villela --rebatizada como "Sua Incelença Ricardo 3º", em cartaz em São Paulo após percorrer 27 cidades do país, apresenta o vilão como um coronel nordestino(a Clowns de Shakespeare também planeja encenar "Hamlet" em 2013); dois outros espetáculos shakespearianos concebidos por Gabriel Villela estão em São Paulo : "Macbeth" em cartaz até agosto, e recém-estreado "Romeu e Julieta".Uma a montagem de "Hamlet" vai a cena em outubro em São Paulo,drigida por Ron Daniels e protagonizada por Thiago Lacerda. E Barbara Heliodora, especialista na obra de Shakespeare, prepara a tradução de duas peças inéditas do autor no país: "Eduardo 3º" e "Os dois nobres parentes".
então, de um estudo meu:
Machado de Assis e Shakespeare --- anotações de um estudo
Aqui, apenas algumas anotações.O estudo das relações, ou melhor: ilações, entre Shakespeare e Machado de Assis integram dois projetos de trabalho mais amplos, ambos em pleno desenvolvimento. – “Machado de Assis e os ingleses”, parte do programa “Machado de Assis e Literatura Comparada”(que inclui os franceses ;os portugueses; os alemães; os gregos; os espanhóis,italianos e latinos); e “leituras dos formadoes de leitores : Machado de Assis,Lima Barreto e Monteiro Lobato”.
O ‘bardo’ britânico foi incomparavelmente a maior influência – e não apenas literária, mas sobretudo filosófica e até mesmo ‘ideológica’ – em Machado : inclusive, o mais incidente nas citações,alusões ,referências e recorrências 
□ os 5 autores de maior incidência
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incid.
quantit. \
autores 
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126 Shakespeare [ou 174 vezes considerando as 48 vezes (Malvolio) na série “Gazeta de Holanda”]
86 mitologia clássica 
66 Homero 
62 Moliére 
59 V. Hugo 
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A marcante influência de Shakespeare em Machado,a par das diversas incidências quantitativas, revela-se especialmente no próprio tom\teor, essência temática shakespeariana – o hamletino ser ou não ser ; o ciúme; até mesmo a insinuação (ou inevitabilidade) do adultério....
Se,p. ex., é comum – a partir do estudo de Helen Caldwell – considerar Otelo a maior, preponderante, quase exclusiva[sic] referência e recorrência em Dom Casmurro, a meu juízo na verdade o âmago referencial está essencialmente em Hamlet – vale dizer, no exercício da dúvida (que afinal é o que o ‘ser ou não ser adúltera’ de Capitu,denunciado pelo ciumento Bentinho, ele o narrador, portanto não-confiável, é transmitido ao leitor, Machado instigando-o a praticar esse exercício...) , de resto – assim como em toda obra de Shakespeare --- o elemento capital na ficção machadiana: dúvida que alimentará e gerará a dificuldade da escolha,recorrente e permanente nas personagens de seus contos e romances, mormente na mulher 
Ambos tratam dos problemas essenciais do ser humano – daí, a universalidade de suas obras. Em ambos, a exposição da fatuidade das paixões humanas, a precariedade do homem quanto ao conhecimento de si , em ambos o ceticismo,na mesma mesclagem do cômico e do trágico. Em comum, a perplexidade diante da ambigüidade e da ambivalência do ser humano. 
Tanto um como no outro, o tema principal pode ser uma história de amor, mas no fundo as condições sociais – e\ou políticas, ou econômicas – acabam por exercer função e efeito especiais na consecução ou irrealização do idílio. Nos contos e romances machadianos, nas peças shakesperianas embora o tema e a ação seja de um romance, há sempre elementos e vetores de ordem social política ou econômica..
Seus personagens e protagonistas são das classes mais elevadas, a classe trabalhadora e proletariado não compõem seus elencos (e ambos foram criticados por um suposto – e equivocado...- esnobismo).
Ambos viveram em sociedade aristocráticas, oligárquicas, de elites dominadoras, em Machado, patriarcal e patrimonialista. Ambos criticavam e ironizavam abusos de riqueza e de poder e privilégios. E eram conscientes das complexas interações sociais desses cenários.
Ambos compreendiam perfeitamente a verdadeira natureza do dinheiro.
mr

domingo, 22 de julho de 2012

um inédito de Santos Dumont


 É tempo de Santos Dumont :  este 23 julho marca 80 anos de sua morte (1932); e no 20 julho (sexta-feira passada) ,há 139 anos (1873) dava-se seu nascimento
 excertos do texto de sua inédita autobiografia"O que eu vi, O que nós veremos",escrito no ano de 1918 em sua casa em Petrópolis (hoje atração turística-cultural da cidade) – a que ele mesmo deu a denominação de “A Encantada”.
Publicarei a obra em edição especial aqui em Petrópolis

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O que eu vi, O que nós veremos.

Estas notas são dedicadas aos meus patrícios  que desejarem ver o nosso céu povoado pelos  Pássaros do Progresso
                                                             Nova York, 15 de maio de 1918
                                                                                 Santos Dumont, Inventor
 (...)
A princípio tinha-se que lutar não só contra os elementos, mas também contra os preconceitos: a direção dos balões e, mais tarde, o vôo mecânico eram problemas "insolúveis".
Eu também tive a honra de trabalhar um pouco, ao lado destes bravos, porém o Todo Poderoso não quis que o meu nome figurasse junto aos deles.
As primeiras lições que recebi de aeronáutica foram-me dadas pelo nosso grande visionário: Júlio Verne. De 1888, mais ou menos, a 1891, quando parti pela primeira vez para a Europa, li, com grande interesse, todos os livros desse grande vidente da locomoção aérea e submarina. Algumas vezes, no verdor dos meus anos, acreditei na possibilidade de realização do que contava o fértil e genial romancista; momentos após, porém, despertava-se, em mim, o espírito prático, que via o peso absurdo do motor a vapor, o mais poderoso e leve que eu tinha visto. Naquele tempo, só conhecia o existente em nossa fazenda, que era de um aspecto e peso fantásticos; assim o eram, também, os tratores que meu pai mandara vir da Inglaterra: puxavam duas carroças de café, mas pesavam muitas toneladas... Senti um bafejo de esperança quando meu pai me anunciou que ia construir um caminho de ferro para ligar a fazenda à estação da Companhia Mogiana; pensei que nestas locomotivas, que deviam ser pequenas, iria encontrar base para a minha máquina com que
realizar as ficções de Júlio Verne. Tal não se deu; elas eram de aspecto ainda mais pesado. Fiquei, então,certo de que Júlio Verne era um grande romancista.
*
(...)
No dia 13 de julho de 1901, às 6 horas e 41 minutos, em presença da Comissão Científica do Aero Club,parti para a Torre Eifel. Em poucos minutos, estava ao lado da torre; viro e sigo, sem novidade, até o Bois de Boulogne. O sol, mostra-se neste momento e uma brisa começa a soprar, leve, é verdade, porém, bastante,nessa época, para quase parar a marcha da aeronave. Durante muitos minutos, o meu motor luta contra a aragem, que se ia já transformando em vento. Vejo que vou sair do bosque e talvez cair dentro da cidade.
Precipito a descida e o aparelho vem repousar sobre as árvores do lindo parque do Barão de Rotschild. Era necessário desmontar tudo, com grande cuidado, afim de que não se danificasse, pois pretendia reparar minha embarcação para concorrer de novo ao prêmio Deutsch.
*
(...)

Reposto o balão e estado de funcionar, revistas e consertadas todas as suas peças, cheio de novo, fiz experiências preliminares. Convocada novamente a Comissão do Aero Club, parti para a Torre Eiffel que circunaveguei de novo; mas, ao voltar, desarranjou-se-me a máquina nas alturas do Trocadero. Manobro para escolher um bom lugar para descer. Supunha ter sido feliz em minhas manobras e esperava descer em uma rua, quando ouço um grande estrondo, grande como o de um tiro de canhão; era a ponta do balão que, na descida, que foi rápida, tocara o telhado de uma casa.
Um saco de papel cheio de ar, batido de encontro a uma parede, arrebenta-se, produzindo um grande ruído; pois bem, o meu balão, saco que não era pequeno, fez um barulho assim, mas... em ponto grande.
Ficou completamente destruído.Não se encontrava pedaço maior do que um guardanapo!
Salvei-me por verdadeiro milagre, pois fiquei dependurado por algumas cordas, que faziam parte do balão, em posição incomoda e perigosa, de que me vieram tirar os bombeiros de Paris.
Os amigos e jornalistas me aconselharam a ficar nisso e não continuar em minhas ascensões, da última das quais me salvara por verdadeiro milagre. O conselho era bom, mas eu não pude resistir à tentação de continuar; não sabia contrariar o meu temperamento de sportsman.
Convoquei-os para nova experiência daí a três semanas. Eu sabia dos elementos com que podia contar; já conhecia, em Paris, umas vinte casas especialistas, cada qual, de um trabalho, e já tinha conquistado a simpatia dos contramestres e operários de quem podia esperar a maior dedicação e serviço rápido.
*
(...)
Eu, para quem já passou o tempo de voar, quisera, entretanto, que a aviação fosse para os meus jovens patrícios um verdadeiro sport.
Meu mais intenso desejo é ver verdadeiras escolas de aviação no Brasil. Ver o aeroplano – hoje poderosa arma de guerra, amanhã meio ótimo de transporte - percorrendo as nossas imensas regiões, povoando o nosso céu, para onde, primeiro, levantou os olhos o Padre Bartolomeu Lourenço de Gusmão.
                                                                                                                  Santos  Dumont












terça-feira, 17 de julho de 2012

Machado e Lima, parentes literários


tenho especial afeição intelectual por essas ações investigativas sobre ilações e interconexões entre grandes escritores, como é o caso desses dois. este estudo,que me é bastante gratificante, corrobora  a possibilidade de se encontrar similitudes e convergências entre,à primeira vista, diferentes e divergentes.


http://www.valor.com.br/cultura/2750104/diferentes-divergentes-mas-muito-proximos

sábado, 7 de julho de 2012

Fla- Flu , no futebol e na literatura


a propósito do centenário do clássico – que segundo Nelson Rodrigues, “nasceu 40 minutos antes do Nada”
Fla- Flu , 100 anos – e também aniversário da primeira invasão de campo,liderada por Coelho Neto.

Torcedor apaixonado do Fluminense (paixão também centenária: 1912) – e tinha os quatro  filhos praticantes do esporte pelo clube (o mais velho, Preguinho, foi o mais famoso, campeão carioca em 1933, 1937 e 1938, e autor do primeiro gol brasileiro em copas do mundo,em 1938; outro dos filhos, também ídolo no Fluminense,  Mano morreu em 1921 devido a um acidente de jogo durante  jogo contra o Andaraí) – Coelho Neto comparecia a todos os jogos do clube, sempre em estado de vibração e fanatismo,e simplesmente promoveu a primeira invasão de campo do futebol brasileiro, em 1916, num ... Fla – Flu ,  a notícia estampada no dia seguinte.
                                                                     Foot-ball  : os jogos de ontem
                                                                     Gazeta de Notícias,23.10.1916  
Foi suspenso por invasão de campo, o match Fluminense - Flamengo
 É profundamente desagradável para nós termos que registrar os fatos vergonhosos desenrolados ontem à tarde, no ground da rua Guanabara, por ocasião da partida de campeonato, entre os primeiros times do Fluminense F. Club e o C. R. do Flamengo.
O público, este nosso público desportivo que de quando em vez julga ser desairoso um dos quadros que combatem conformar-se com as decisões do juiz atuante, invadiu hostilmente o campo, quando os dois times se defrontavam aguardando que os assobios estridentes dos arruaceiros tivessem fim.
Mas não parou ai a saciedade dos assistentes: em massa, brandindo juncos, investiram para o sr. Guilherme Witte, o juiz do match, que, graças à intervenção enérgica e imediata dos diretores do Fluminense, nada sofreu.
A origem dos distúrbios partiu de uma decisão, quiçá irrefletida, do sr. Witte.Punindo um penalty contra o Fluminense, Sidney foi o encarregado de batê-lo; a bola passou sobre as barras do gol de Marcos, perdendo-se em off-side. O referee, porém, anulou o penalty ordenando um segundo, e isso porque Paulo Buarque, jogador do Flamengo, achava-se no interior da área de penalidade, quando a bola foi impelida, desrespeitando deste modo o texto das regras de football adotadas pela Liga Metropolitana.O segundo penalty, atirado por Riemer, resultou em um goal para o clube de regatas.Retornou a bola ao centro, alinhando-se as equipes à espera de uma nova saída.
Estrugiram de todos os cantos as vaias ao referee, anormalidade esta que se prolongou cerca de dez minutos, sem que qualquer reação, se fizesse sentir, terminando pela invasão completa do campo, com prejuízo para a boa marcha da partida, que foi suspensa imediatamente.
Não queremos criticar a opinião abalizada do sr. Guilherme Witte. Entretanto, julgamos de toda a infelicidade a sua deliberação.
Se Paulo Buarque se achava na área de goal antes de ser batido o penalty, era da competência e dever do juiz chamá-lo à ordem. Se Paulo Buarque investiu após soar o apito, colocando-se, mesmo antes de Sidney chutar em goal, frente a frente de Marcos, a punição deveria recair sobre o team do Flamengo, mas nunca contra o Fluminense, que não podia ser castigado pela infração de um jogador adversário.
 Conhecemos o alto grau de desprendimento, acima de qualquer suspeita, com que Guilherme Witte costuma dirigir um match. O cochilo de ontem, porém, foi sensível demais, por isso que vem desfazer o resultado de uma luta, de grande responsabilidade no campeonato, empatado até então.
O jogo, em suma, pelas recentes leis da Metropolitana, tem que se realizar novamente, em campo neutro.

[excerto de meu livro, Lima Barreto versus Coelho Neto: um fla-flu literário(Difel,2010)]

terça-feira, 3 de julho de 2012

Brasil X Argentina, segundo Arthur Azevedo

a propósito da eterna rivalidade Brasil-Argentina [e desse Corinthians X Boca Juniors, pela decisão da Libertadores da América,em 04.07], e pelos também duelos na ficção literária : um delicioso conto criado por Arthur Azevedo em 1897 (e que encontra-se em meu livro,ora publicado -- junho 2012, ImãEditorial,impresso e e-book-- Arthur Azevedo: cenas da comédia humana - contos em claves temáticas(o conto está sob a  rubrica "política e esperteza")

 As pílulas
Há muitos anos havia no Rio de Janeiro um boticário, em cujo estabelecimento se reuniam todas as noites - das sete às dez - uns indivíduos que não faziam outra coisa senão discutir sobre política.
Uma noite apareceu na roda, levado por um dos mais velhos frequentadores da botica, certo oficial argentino, revolucionário, que fora deportado da sua terra, e andava comendo o  negro pão do exílio ...no Frères Provençaux
Desde o instante em que esse elemento exótico apareceu na botica, cessou completamente a cordura que havia naquelas confabulações tranquilas e burguesas.
O argentino a propósito de tudo deprimia os homens e as coisas do país que  o agasalhava, poupando, nas suas impertinências invectivas, apenas a nossa natureza.
A roda era pacata; nenhum dos presentes tomava a peito, com o indispensável ardor, a defesa, aliás facílima, da nossa terra; e quando um deles se atreveu a dirigir-se em voz mais alta ao argentino, este de tal sorte gritou, gesticulou e regougou , e tantas vezes bateu com a bengala no chão  e na grade que separava o  boticário dos seus fregueses, que houve ajuntamento de transeuntes à porta da botica. .
O dono da casa, homem de bom natural, que raro se envolvia nas conversas, aviando pachorrentamente lá dentro as receitas enquanto cá fora se discutia com mais ou menos calor, o dono da casa dessa vez saiu do sério e do almofariz, e veio dizer ao revolucionário que não gritasse tanto.
É  bem de ver que o homenzinho, habituado a revoltar-se contra os governos de seu país, não suportaria que um simples boticário lhe viesse dizer que não gritasse.
Gritou mais e mais, e tais coisas disse, que o dono da casa acabou por gritar também.
- Ponha-se no olho da rua, seu patife ! bradou-lhe num tom que não admitia réplicas.
E, segurando o argentino pela cintura, obrigou.o, com um empurrão, a dar um pulo até o  meio da rua.
*
No dia seguinte o boticário foi desafiado para um duelo. Entraram-lhe em casa dois sujeitos mandados pelo argentino, que lhe pediram indicasse dois amigos com quem eles se entendessem para regular as condições do encontro.
O boticário, sem levantar os olhos do alambique, disse-lhes que sim, que as suas testemunhas lá iriam ter ;  mas desde logo preveniu aos dois sujeitos que, sendo ele o desafiado, cabia-lhe a escolha das armas.
-- O nosso comitente aceita qualquer arma, pois todas maneja com igual perícia. Já teve quinze duelos no Rio da Prata; matou sete adversários e feriu oito !
-- Pois olhem, meus senhores, respondeu o boticário sempre às voltas com o alambique -- a mim não me há de ele matar nem mesmo ferir.
Nesse mesmo dia reuniram-se as quatro testemunhas e acordaram que o duelo se realizaria na manhã seguinte, no Jardim Botânico. O boticário forneceria as armas.
                                                                 *
À hora convencionada achavam-se a postos os adversários, os padrinhos e um médico levado pelo argentino.
- Então? as armas? ... perguntou este, olhando em volta de si.
- As armas cá estão, disse o boticário aproximando-se e tirando uma caixinha da algibeira do colete. Escolhi estas.
E, abrindo a caixinha, mostrou duas pílulas .
 - Pílulas ! exclamaram todos.
- Pílulas, sim. Este senhor é um militar, um duelista que se gaba de ter matado sete homens, e que maneja perfeitamente a espada, o sabre e a pistola ; eu sou um pobre boticário, que não tem feito outra coisa em sua vida senão remédios. Se algum dia matei alguém, fi-lo sem ter consciência disso... Cabia-me a escolha das armas : escolhi as minhas ...
- Mas isso não é sério ! exclamou o revolucionário.
-- É mais sério do que usted supõe ; uma destas pílulas tem dentro ácido prússico ;  a outra é inofensiva. Tiremo- las à sorte, engulamo- las, e o que tiver escolhido a envenenada em poucos segundos deixará de pertencer ao número dos vivos.
E, apresentando a caixinha ao adversário :
- Sirva-se.
- Nunca ! não me presto a um duelo ridículo !
- Ridículo? ora essa ! trata-se de um duelo de morte, e eu não os compreendo senão assim. Quando aqui vim foi disposto a morrer ou a matar.-- Vamos, faça  favor de escolher uma das pílulas !
O argentino estava lívido.
- Se  usted não quer escolher, escolho eu ; mas se não é um covarde, tem que tomar a outra imediatamente, porque os efeitos do ácido prússico são prontos !
E, tirando uma das pílulas, engoliu-a serenamente.
-Bom; já engoli uma ; vá ! a outra ! depressa !...
O  revolucionário não se podia ter nas pernas.
 - Ah! não quer engolir a outra? Pois engulo-a eu, porque são ambas de miolo de pão, e usted é um  maricas !
E engoliu a outra pílula.
                                                              *
Nesse mesmo dia o argentino deixou o Rio de Janeiro. Foi comer noutra parte o negro pão do exílio.